25 de Março de 2023





RUI FONSECA

CEO Altronix





Não se nasce Líder


São várias as situações nas quais ouvimos comentários referindo-se a uma criança ou jovem que afirmam que o mesmo tem um perfil de “líder nato”. Como se alguém por algum golpe de genética nascesse líder ou com competências para que o denominem como líder.



U

m líder não é um líder porque tem autonomia, proatividade, dinamismo ou capacidade de influenciar os outros de alguma forma. Afirmo: Ninguém nasce líder, pode é nascer com algumas caraterísticas de liderança.

Começo este artigo a lançar uma premissa sobre a qual várias vezes me debrucei, chegando à conclusão que um líder não é aquele que chefia uma equipa, um líder não é um empreendedor, um fundador de uma start-up ou de uma multinacional. Não é por alguém ser CEO, gestor ou empresários que é Líder.

Nas redes sociais e nos mais variados círculos de networking fala-se de Liderança como se se tratasse de algo palpável, que ou se possui ou não. Acredito verdadeiramente que a liderança é muito mais objetiva, fundamentada com competências técnicas e transversais, que são realmente também desenvolvidas com a experiência, mas acima de tudo com a vontade em aprender essas competências.

A maior competência de um líder tem de ser a competência de adquirir competências. Não considero válido um CEO, autodenominado Líder, que não tenha o mínimo know-how e aptidões em RH, recrutamento, finanças, de fiscalidade, de marketing, de conhecimento técnico sobre o funcionamento da sua produção, por exemplo. Tendo começado a minha carreira nessa vertente, ainda hoje em dia, quando algum equipamento fabril avaria na Altronix, sou capaz de, em conjunto com a equipa técnica da manutenção, analisar problemas mecânicos e sugerir soluções para os mesmos problemas. Não considero viável um Líder, um Diretor, um Team Leader, uma Chefia, mesmo que rodeado das pessoas certas e dos profissionais mais competentes estar numa reunião com os seus superiores ou com uma determinada equipa da empresa e não ser capaz de acompanhar os conceitos, os temas abordados, por não ter esse conhecimento. A formação, a pesquisa e procura em conhecer os diferentes conceitos é importantíssima para que um líder tome decisões capazes e passíveis de sucesso.

Também existe o outro lado da moeda: uma narrativa que defende que um líder tem de dar o exemplo apenas pelas competências técnicas. Isso é falso. Um líder deve dar o exemplo em competências transversais aos líderes como ser uma boa pessoa, idónea, honesta, competente, resiliente, determinada, comunicativo, entre muitas outras. Para liderar ou gerir um hospital não temos necessariamente de ser médicos.

Outra lacuna existente na liderança que consigo identificar é um líder que está numa empresa de uma área para liderar uma equipa de uma área totalmente diferente, como por exemplo área automóvel para área têxtil e levar consigo exatamente a mesma metodologia de liderança. Não pode.

Em primeiro lugar é necessário que estude muito bem a sua equipa com as técnicas existentes, como é exemplo

modelo DISC. Pessoalmente prefiro o modelo da AMA (American Marketing Association) mas existem variadíssimos modelos e metodologias para este efeito de estudo e análise de equipa. Outro exemplo é fazer analises SWOT das nossas equipas para perceber muito bem os pontos fortes e fracos para detetar oportunidades de melhoria nas equipas. O que nunca pode ser feito é levar de montante a jusante a mesma metodologia de empresa para empresa, de equipa para equipa. Todas as empresas são diferentes e todas as equipas são diferentes.


Ser líder é um constante ser posto à prova


Ser líder é das tarefas mais difíceis que existe


Por outro lado, existe uma narrativa de que a imagem que criamos da Liderança ou de um Líder é algo extremamente positivo, uma pessoa que tem uma equipa na qual deposita confiança e que corresponde em resultados. Uma pessoa com soft-skills inacreditavelmente completas, associadas a hard-skills técnicas que permitem criar uma persona praticamente inatingível de um líder, com uma aura quase mística, que todos ambicionamos ter. Na verdade, ser líder não é tão fácil como se faz transparecer nas partilhas do Linkedin. Envolve muita capacidade de tolerância, de aceitar que os dias não são todos brilhantes, que por vezes é um trabalho solitário, que as vendas não são sempre de margens incríveis, que as pessoas nas quais apostamos decidem abandonar um projeto de carreira ou que as estratégias falhem. Ser líder é ter a capacidade de “engolir sapos”, aceitar 

o erro e ver nele uma oportunidade de melhoria e acima de tudo passar uma mensagem de positividade, de sorriso no rosto, de solução, objetivo e estratégia perante as adversidades.

Citando James Gulliver, fundador de uma grande cadeia de retalho: “Retail is detail” e consigo corelacionar esta menção com a gestão de pessoas. Gerir pessoas trata-se, na grande maioria das vezes, de trabalho de detalhes. Por vezes focamo-nos nos processos macros, quando o segredo está nos processos micro… que todos juntos se tornam macro. Existe uma gigante diferença entre comunicar com a nossa equipa com um “Bom Dia” e comunicar com a nossa equipa com um “Bom dia Maria” ou “Bom dia António”.

E como disse anteriormente, um líder não pode ser auto ou hétero proclamado. Não confio que existam verdadeiras lideranças empíricas, reconhecidas pela experiência e prática. Consigo avaliar que uma liderança tem sucesso quando isso é fundamentado, com objetivos, métricas, indicadores e acima de tudo resultados… nas pessoas, no valor criado, nos processos e nos objetivos.

Ser líder é um constante ser posto à prova. Um líder bom pode dizer que o é quando lida com estas responsabili­da­des, quando tem o engajamento de uma equipa na concretização dos objetivos comuns e é acima de tudo quando consegue perante grandes adversidades, que podem causar graves perdas, seja financeiras, seja de capital humano, ou nas mais variadas matérias, ter a capacidade de tomar a melhor das piores decisões. E com isto, passar de “bestial” a “besta” é algo que pode acontecer de um momento para o outro e em muitos casos, não é controlável pelo próprio. Aceitar, faz parte do percurso da liderança.

Concluo, reiterando que ser líder é das tarefas mais difíceis que existe, não é para todos e que quem o escolhe ser, tem um trabalho duro, contínuo e que nem sempre gera os resultados pretendidos no timing pretendido. E está tudo bem quando não se quer ser líder.




‟ Gerir pessoas trata-se, na grande maioria das vezes, de trabalho de detalhes.


Rui Fonseca

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