Era uma vez…

Daniela Moreira
1 de Abril de 2020

Um povo de um planeta distante, que insistia em viver num ritmo acelerado. A falta de tempo era crescente, mesmo reduzindo o seu tempo de descanso, com todas as implicações que isso pudesse vir a ter na sua saúde física e mental, continuavam a não ter tempo para si e para o que era mais importante para eles, dado o ritmo frenético que iam impondo à forma como viviam as suas vidas, sem muitas vezes, terem real consciência disso. Andavam sempre a correr e só paravam quando a vida lhes pregava uma partida e aí, afinal passavam a ter todo o tempo do mundo. Passavam dias, meses e anos sem falar ou estar com familiares e amigos de quem de facto gostavam, sob pretexto que estavam tão ocupados nesse dia, que no dia seguinte certamente o iriam fazer. 


Trabalhavam quase todos os dias da semana e na maior parte dos dias em que não trabalhavam, estavam a organizar-se para poderem voltar à corrida da semana. Lutava-se muito neste planeta pelo ter, pelo poder e muito pouco pelo ser, tanto que estavam convencidos que nada seria capaz de lhes abalar a base das necessidades da pirâmide de Maslow (fisiologia e a segurança). Até que um dia, vindo não sabem bem de onde, apareceu uma criatura invisível, que fez com que o planeta parasse, começaram a ficar doentes, perderam-se muitas vidas e aí começaram a ter que reflectir sobre o que de facto é o mais importante e se as necessidades do topo da pirâmide, por si só, justificam os seus comportamentos.

 

Esta parábola pode ilustrar o momento mais delicado e desafiante em termos de humanidade, sociedade e económico também, que estamos a atravessar. Desejo que o ultrapassemos com o menor número de perdas humanas e materiais possíveis e que voltemos a ter a liberdade de podermos sair à rua, sem limitações legislativas e principalmente sem restrições a nível fisiológico e de segurança.

 

Creio que quase todas as pessoas, já ouviram pelo menos falar da pirâmide de Maslow, de qualquer forma, vou contextualizar. Abraham Maslow (1908-1970), foi um psicólogo americano, que ficou conhecido pelo desenvolvimento da chamada Teoria das Necessidades Humanas ou Pirâmide de Maslow. Esta pirâmide resumidamente dá-nos a seguinte informação: as pessoas têm um conjunto de necessidades diferentes, que se sobrepõem umas às outras hierarquicamente. Assim, ao superarem uma necessidade (uma camada da pirâmide), a motivação da pessoa é redireccionada para a camada seguinte. As principais motivações do ser humano estão relacionadas, em primeiro lugar com a sua fisiologia (base da pirâmide), em segundo à segurança, em terceiro aos seus relacionamentos, em quarto à sua auto-estima e, por último, à sua realização pessoal (topo da pirâmide).

 

Pela primeira vez na nossa vida, estamos de forma global a sentir que as necessidades mais básicas ao nível da fisiologia e da segurança estão em causa, provocando-nos sentimentos estranhos e desagradáveis, nunca antes experimentadas pela maioria das pessoas, pelo menos, durante tanto tempo. O que dávamos como adquirido, afinal não o é, obrigando-nos da pior forma, a reordenar as nossos motivações, vemo-nos forçados a tirar o foco, a motivação nas necessidades situadas do meio para o topo da pirâmide, para nos focarmos no mais básico, a sobrevivência.

 

Estou certa, que vamos ultrapassar esta fase e que a humanidade vai continuar a existir, mas não sou utópica ou sonhadora, para achar que vamos todos ficar bem e que o mundo se vai tornar num sítio idílico, em que fomentará a cooperação, a empatia, o respeito… Infelizmente não vamos ficar todos bem, ainda que tenha a esperança que iremos quase todos sobreviver. Vamos sair disto, mais pobres emocional e financeiramente e principalmente mais sofridos, com todas as consequências que daí irão advir.

Sou economista, de formação, e gestora de profissão, por isso, é-me difícil não tentar antecipar o como será depois do vírus. Já ouvimos especialistas de todas as áreas, com diferentes conclusões, ainda que com uma tendência generalizada para o alarmismo. O pânico, não ajuda a tomar boas decisões e até nos pode pôr doentes. Se olharmos para os últimos 100 anos passaram-se muitas crises e todas elas foram ultrapassadas, não obstante, as dificuldades não serem as mesmas para todos.

 

Agora sem alarmismo e com o que me parece uma perspectiva realista, as empresas vão passar por muitas dificuldades, muitas empresas vão falir, algumas vão prosperar e a maior parte vai sobreviver, muitas pessoas vão perder os empregos e muitas vão encontrar outros, muitas pessoas vão empreender e criar o próprio negócio e mais importante do que tudo isso, é que paulatinamente vamos todos recuperando, somos capazes de vencer mais este desafio. Tenho uma réstia de esperança que esta luta desenfreada pela sobrevivência económica, não nos faça regredir completamente, enquanto seres humanos; vamos ser mais prósperos economicamente, mas não nos esqueçamos, que os fins não justificam todos os meios.

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